Essa pergunta pode ser traduzida da seguinte forma: “considerando que eu sou uma pessoa qualificada, o que mais eu tenho que ter para ser, ao menos, chamado para participar de um processo seletivo?’
Para responder mais assertivamente essa questão é fundamental entender o contexto em que estamos vivendo no que diz respeito ao mundo dos negócios e trabalho. Nesse caso, esse novo mercado já estava diferente antes mesmo da pandemia. O covid-19 só feito acelerar as modificações que o mundo dos negócios já vinha sinalizando e que as pessoas não estavam percebendo. Agora ficou evidente…
Apesar de já existir uma consciência de que, com os avanços da tecnologia e a utilização da internet, as informações passaram a ser muito rapidamente espalhadas pelo planeta, muitas pessoas esqueceram de se observar e ver se ainda estavam adequadas para este novo cenário.
Uma mudança como essa na sociedade só pode gerar transformações nas relações, nas necessidades, nos negócios e nos comportamentos. Assim, diante de tantas inovações que foram chegando para as sociedades, surgiu uma alta concorrência e para que as empresas sobrevivessem, essas por sua vez, tinham também que apostar em inovações e participar do jogo, senão estariam fora do mercado de vez. Para isso, tiveram que apostar em profissionais diferenciados, que além de qualificação, teriam algumas atitudes necessárias a esse novo contexto.
Levando isso em consideração, então, podemos perguntar: o que um profissional precisa ter de forma a ter uma carreira de sucesso nesse mercado rápido, inovador e mutante? Chegamos ao profissional com uma atitude empreendedora, mesmo que ele não queira empreender.
De uma forma mais ampla, a atitude empreendedora seria um conjunto de comportamentos de um indivíduo com foco no alcance de metas. Para isso estariam envolvidos os fatores de personalidade conhecidos como Big Five (conscienciosidade, amabilidade, abertura à experiência, extroversão e estabilidade emocional), além dos fatores psicológicos como propensão ao risco, lócus de controle interno, autoeficácia, motivação e atitude. Todos esses fatores seriam variáveis consideradas como preditoras da intenção empreendedora em muitas pesquisas.
Vamos entender melhor tudo isso?
A grosso modo, a pessoa ter conscienciosidade seria ter traços de cuidado, prontidão ao exercer tarefas com disciplina e seguindo as regras; ter amabilidade em maior ou menor grau estaria ligado a ter a capacidade de se preocupar com o próximo, de se colocar no lugar do outro, ou seja, equivalente a ter empatia; a extroversão seria a facilidade para interagir com pessoas e se sentir bem em grupos ou equipes; a abertura à experiência estaria ligada à abertura ao novo, à facilidade de se adaptar a mudanças; e por fim, o grau de estabilidade emocional ou neuroticismo da pessoa seria a maior ou menor dificuldade da pessoa reagir a fortes emoções e de se recuperar após a vivência de algum impacto emocional. As pessoas com maior pontuação em neuroticismo tendem a ter dificuldade para enfrentar obstáculos, além de apresentarem comportamento imprevisível, sendo mais reativas e ansiosas.
Assim, fica claro considerando o contexto em que estamos vivendo que pessoas mais flexíveis e que se adaptam ao novo com maior facilidade, que estão abertas a novas experiências, que conseguem ter equilíbrio para lidar com as pessoas em equipes e grupos e pessoas que conseguem lidar com ambientes complexos (com menos regras e menos clareza) são aquelas que tendem a atender de forma melhor às demandas das empresas.
Por outro lado, há que se considerar, também, os fatores psicológicos mencionados no início do texto que geram comportamentos. Um exemplo é o lócus de controle, que pode ser interno ou externo. As pessoas que entendem que o que acontece com elas é de responsabilidade delas e não do meio externo são as que são mais adequadas ao momento atual e possuem lócus de controle interno. Nesse caso a pessoa entende que dentro dela estão os recursos que podem resolver uma situação e, assim, ela verifica os recursos que tem e passa a usá-los de uma forma melhor para alcançar seus objetivos. Por outro lado, a pessoa com lócus de controle externo entende que o que acontece com ela é fruto do meio externo e que ela não tem nada a ver com isso. Portanto, esta pessoa tende a esperar que algo aconteça ou que alguém interceda por ela para solucionar um problema. Essas são as pessoas com lócus de controle externo.
Em um mundo incerto e mutante, saber lidar com as incertezas é parte importante da existência e, portanto, as pessoas que se saem melhor são as que se arriscam, pelo menos, de forma controlada. A pessoa que necessita de total segurança para agir tende a ficar paralizada diante de algumas situações. Assim, o grau de exposição ao risco também é um fator psicológico que vai influenciar no comportamento. Outros fatores importantes são a autoeficácia e a motivação. Pessoas que têm confiança na sua capacidade não hesitam e seguem em frente mesmo que tenham que voltar e fazer de novo alguma tarefa. Pessoas que se autoestimulam não dependem do meio externo para se sentirem motivadas e terem um bom desempenho. Elas próprias se estimulam e ficam motivadas para exercer suas tarefas independente do meio em que estejam.
Agora que já discutimos comportamentos e fatores , penso que vale lembrar que segundo a Teoria Social Cognitiva (TSC) o indivíduo não é passivo em relação ao meio. Ao contrário, ele é agente e toma decisões considerando o meio em que vive. Assim, a forma como ele age no meio em que está inserido vai fazer toda a diferença. E é aí que entra o que falta para alguém conseguir um espaço no mercado de trabalho muitas vezes.
Isso significa que, não adianta ter conhecimento e não utilizá-lo para mudar as circunstâncias ao seu redor. Se o indivíduo não tiver a intenção de fazer algo e ficar simplesmente esperando um acontecimento ou algo externo para agir, possivelmente ficará à margem do mercado de trabalho. Enquanto isso, o outro que analisa os recursos que possui (autoconhecimento) e age mesmo que errando, vai aos poucos se aprimorando e vai ser aquele que terá o o seu espaço reservado no mundo dos negócios. Isso vale para empreendedores e não empreendedores.
Uma coisa é ter a postura de esperar a compra de macarrão para fazer uma macarronada e, outra é, ao verificar que não se tem macarrão, observar o que se tem de ingredientes e, a partir deles, fazer o cardápio. Você percebe como a segunda postura é bem mais adequada ao mundo de hoje? A proatividade é fundamental.
Só que muitas pessoas se julgam abertas ao novo, inovadoras e proativas, porém, quando você chega para ela que é, por exemplo, advogada e diz que não tem vaga para advogada, mas tem para analista comercial, muitas vezes ela não quer a oportunidade. Isso porque quis ser advogada, fez faculdade de Direito, Pós-Graduação em X, Y, Z e não aceita o novo. A postura do profissional no mundo de hoje tem que ser de desapego ou desprendimento ao que sempre foi, ou seja, ao padrão que existiu até agora. Essa atitude foi apenas um exemplo do que tenho visto por aí na nossa sociedade.
Outro exemplo seria o modelo de negócio ou de atividade das pessoas diante da necessidade de isolamento social. Muitas pessoas enfrentaram uma pandemia sem sequer analisarem se de fato não podiam exercer alguma atividade remunerada diferente da que fazia antes. A menor ou maior dificuldade de sair da zona de conforto fará a diferença entre os profissionais do mercado.
Em minha experiência de 36 anos de trabalho, sendo 20 anos somente na área de Recursos Humanos, estou cansada de ver pessoas tentando fazer o de sempre. A pessoa diz “Quero dar aulas.” Tudo bem. Mas o mercado está se tornando muito virtual e aulas online são uma tendência. O profissional ao invés de tentar se adaptar e até se prevenir, fica insistindo em algo que já não tem tanto valor dentro do novo contexto.
Largar a zona de conforto é difícil. Sabemos disso. Mas é preciso que a gente entenda que aquele que larga com mais facilidade a zona de conforto é o que se adapta melhor ao novo, o que se arrisca para uma atividade meio que multifuncional tão comum nos dias de hoje e o que tem coragem de ousar em uma atividade que está sendo iniciada agora. Daqui para frente temos que ser mais flexíveis, mais desapegados do passado…..o mundo está mudando sempre mais rápido, se criarmos raízes extremamente profundas nos negócios, vamos ficar no mesmo lugar e vão passar por cima de nós.
Vejam que não estamos falando de qualidade, de formação acadêmica. Estamos falando de atitude. Comportamento. Sei que é duro falar disso para alguns que já estão há muito no mercado de trabalho, mas esta é a realidade de hoje. Ou nos adaptamos rapidamente ou estaremos fora. É uma questão de escolha ou mesmo de necessidade. Agora é o momento de pensarmos em como temos agido e como podemos passar a agir daqui para frente se quisermos continuar na ativa.
Cuidado porque a nossa mente às vezes mente para a gente. Às vezes nos achamos muito flexíveis, abertos a mudanças, mas será mesmo? Vamos refletir um pouco mais profundamente e, se preciso for, trocar uma ideia com outros profissionais para a gente ter uma percepção mais realista dos nossos próprios comportamentos. Não parece uma boa ideia?
Sorte para todos! Estamos aqui para ajudar a quem precisar.